Atualizado em 25/07/2018
Quando o nome e as ideias de Marco Feliciano explodiram na mídia, as expressões mais comuns ligadas a ele eram de representação, com as pessoas, principalmente na Internet, dizendo se ele as representava ou não.
A partir daquele momento, a expressão tornou-se extremamente popular e utilizada para tantos outros assuntos. A ideia geral é que, se uma pessoa/instituição defende algo que você acredita, ela te representa; do contrário, não te representa.
Mesmo que na maioria dos casos essas frases sejam usadas de maneira simbólica para uma situação específica e apenas pelo “modismo da expressão”, há vezes que as pessoas realmente se sentem representadas por outras; muitas vezes sem nem usar a frase em questão.
Pra começar, nossa própria forma de governo, a democracia representativa, é inteiramente baseada nisso e é um grande problema, como já critiquei em outra publicação:
Nosso sistema permite que escolhamos quem irá nos representar, mas não nos dá a menor garantia de que as pessoas escolhidas irão realmente nos representar ou pelo menos cumprir o que prometeram. Pior do que isso, mesmo quando de fato quebram alguma lei (visto que quebrar uma promessa com eleitores não é digna de um processo), ínfimas vezes são acusados e em vezes que podemos contar nos dedos são punidos.
Mas, não irei tão longe. Manterei-me no RAP Brasileiro que a situação já é complicada o suficiente! Nossa cultura foi fundada pela contestação, pelo protesto, pelas opiniões fortes. Nossos artistas são conhecidos por não ficarem em cima do muro e por costumeiramente apresentarem uma linha de raciocínio muito diferente (embora o conceito de “diferente” seja completamente subjetivo, entendam “diferente do padrão da sociedade”).
Assim, através de letras e discursos fortes, muitos deles atraíram milhares (milhões) de seguidores. Nada que cause espanto. Afinal, se uma letra faz por você o que um pai/uma mãe não fez, como com certeza aconteceu e acontece na vida de muitos pelo Brasil, é completamente aceitável que uma relação de proximidade seja criada entre seu autor e o fã.
Entretanto, essa relação de proximidade pode causar enormes problemas quando a pessoa deixa de pensar e refletir por ela mesmo e acaba aceitando tudo que é dito pela outra; e aqui me refiro não só a fãs e ídolos, mas a leitores e autores, pais e filhos, mais velhos e mais novos, etc.
“Ah, mas isso é muito presunçoso. Quer dizer que não devemos aceitar o conhecimento dos outros e temos a verdade absoluta sobre todas as coisas?”. Sim e não. Não, porque a verdade absoluta sobre as coisas é inalcançável; a verdade se apresenta pra você como uma informação passada adiante que na melhor das hipóteses será apenas o ponto de vista de alguém confiável pra você, o que nunca será a verdade absoluta (mesmo se você estivesse no local e visse o acontecido, não seria a verdade absoluta, pois assim como seu coleguinha que passa a informação, você também tem sua cultura, seu conhecimento pessoal e todo o resto que faria você julgar o que viu da sua maneira).
E sim, porque ninguém melhor do que você mesmo pra te dizer o que pensar da vida; ninguém melhor do que você pra correr atrás das informações necessárias e chegar a sua própria conclusão.
Por isso, digo e repito: nenhum rapper me representa! Não por me achar mais inteligente que todos eles, não me entenda errado; acredito que todos devemos ser donos da nossa própria verdade, senão nos transformamos apenas em massa de manobra, seja pro sistema, seja pro rapper/filósofo/pensador/autor/político em questão.
Quando você abraça a pessoa do rapper e não a ideia que ele está passando, você se torna alguém manipulado por aquela pessoa; se ele resolver mudar de opinião amanhã, toda sua crença e sua filosofia de vida vão por água abaixo. Você se tornará extremamente dependente daquela pessoa!
Quando você abraça a ideia que uma letra de RAP te passa, não importa o que o rapper faça, a ideia ainda se mantém. “Ah, mas se o rapper se provar vendido no futuro, isso significa que tudo que ele escreveu é ‘vendido’, não?”. De forma alguma e esse é exatamente o meu ponto!
As reflexões, instigações e as inspirações que uma letra de RAP me deram nunca poderão ser tiradas de mim, não importa o que aconteça; não importa se o rapper disser que ele tava mentindo, pois eu analisei a frase, pesquisei, procurei e, na minha percepção, já havia chegado à conclusão necessária, mesmo que eu não tenha tido toda visão do negócio (porque como eu disse, a verdade absoluta é inalcançável). Resumindo: todo dinheiro do mundo pode fazer um rapper dizer algo, mas não existe o suficiente pra tirar de mim o que uma letra de RAP me fez sentir.
Rappers, assim como professores, não podem te ensinar coisa alguma se você não quiser aprender. Conhecimento não pode ser passado, precisa ser adquirido. Rappers, assim como professores, só podem te inspirar a ir atrás das respostas, nunca te “ensinarem a resposta correta”. Até porque, mais uma vez, não existe a resposta correta, apenas a sua percepção do que é correto ou não (aqui, obviamente, me refiro a questões além da matemática, por exemplo).
Muitas pessoas atacam rappers por terem mudado sua forma de pensar, mudarem seu discurso, quando na verdade estas mesmas pessoas é que são culpadas por sua decepção. Foram elas que abraçaram a percepção da verdade de alguém como verdade absoluta, antes de criarem uma percepção própria. Quando o rapper mudou de opinião, o que pode acontecer quando uma nova informação é adquirida, essa pessoa ficou perdida e não sabia mais no que acreditar.
Por exemplo, se no futebol, ao ver um lance, o comentarista afirma com todas as forças que estava impedido. Fala e fala de novo. E no dia seguinte, diz que não estava, você vai achar isso errado e vai acusar toda sua contradição, certo? Entretanto, será que não é possível que ele tenha visto em uma nova câmera (recebido novas informações) e, com base naquilo, tenha mudado sua percepção do que é correto? Você preferiria que ele se mantivesse defendendo o que ele já sabia estar errado ou que assumisse o erro e tentasse corrigi-lo?
Não tem a ver com “não acredite nos outros”, tem mais a ver com “acredite mais em você mesmo”. Você tem dois olhos, duas orelhas, um cérebro e o alcance às informações como qualquer outro, não precisa aceitar outras percepções da verdade além da sua. Talvez, você chegue na mesma conclusão, mas chegará por um processo de conhecimento que te ajudará a absorver a informação e a utilizá-la em tantas outras situações.
Repense, reflita, revolucione.
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