Atualizado em 14/06/2016
Talvez eu nem seja o melhor cara pra escrever sobre isso, era bastante novo na época do Sabota. Entretanto, tenho essa percepção de que ele mudou o pensamento do RAP de uma maneira que poucos fizeram e vão fazer na história. Nem digo pela qualidade, mas pelo estilo, pelo “além-RAP” também.
O Racionais não foi o primeiro a fazer RAP, mas a partir dele, a partir do estilo que impôs e o sucesso que fez, o RAP começou a tomar aquela forma. A maioria dos grupos que surgiram ali ou logo depois dos caras, faziam um som bastante parecido: cara de mau, estilo gangster e a direta letra e batida.
O RAP ficou meio que fadado a seguir aquele estilo. O que não necessariamente era algo ruim, porque dois dos maiores grupos são dessa época e fazem esse estilo: o próprio Racionais e o Facção Central (entre muitos outros). Mas, era muito “limitado” para um gênero musical que surgiu da liberdade. O RAP surgiu sem regra alguma pra ser criado, era muito estranho que existisse uma “cartilha” pra ser rapper.
Era preciso chegar um cara com uma certa moral pra dizer “pô, acho legal o que cês tão fazendo, mas… quero fazer assim!”. Sabotage. É verdade que o Gabriel o Pensador já fazia uma parada bem diferente há anos, mas ele é branco e rico, pouca gente (do RAP) dava valor a ele como rapper, mesmo sendo um dos mais inteligentes e melhores do país.
Aliás, o fato do Gabriel o Pensador e o Planet Hemp terem sido duas das maiores influências no RJ mostra o quanto o RAP de lá é, de uma maneira ou de outra, diferente do de SP. O RAP carioca já tinha uma mistura maior. Entretanto, mesmo assim, muita gente que ouvia o Pensador e o Planet nas antigas, não ouve RAP agora e não os considera rappers, ou grupo de RAP. Principalmente, se você é de fora do eixo RJ-SP. Na época, as informações eram escassas, o Racionais era o modelo de RAP e qualquer coisa diferente daquilo era, no máximo, música de protesto, de juventude, mas não RAP em si (talvez, uma variação).
Foi a partir do Sabotage que parece que as coisas mudaram e passaram a ver o RAP com outros olhos ao invés de ver os artistas com outros olhos. Passou-se a aceitar que o RAP podia ser muito mais do que parecia ao invés de desvirtuar os artistas diferenciados do gênero. Claro, ele era negro, morador de favela, vivia aquilo no dia a dia, eles não podiam falar que ele não era rapper. E mesmo assim, não tinha vergonha de mostrar alegria, de sorrir, de misturar os estilos no seu som, outros instrumentais, fazer filmes, ir pra TV, etc.
Lá em 2000 ele já demonstrava como seria o RAP nas próximas décadas. Aliás, por isso, muita gente, principalmente os que trabalhavam com ele, o consideravam bem à frente do seu tempo. Claro que isso rendeu a ele diversas críticas, principalmente do público que tinha mente fechada e não aceitava que ele aparecesse na TV e coisas do gênero.
Felizmente, isso mudou e, merecidamente, hoje ele é visto como um dos melhores, um revolucionário. Não à toa o comparam a Che Guevara. Suas armas não eram de calibres mensuráveis, carregava apenas um carisma enorme e uma mensagem maior ainda. Assim, mudou o modo como as pessoas ouviam e conheciam o RAP; mais do que isso, mudou o modo como o próprio RAP se ouvia!
Mesmo se o Sabotage não tivesse feito RAP, o RAP ainda assim existiria. Mas, pode ter certeza que não chegaria a tanta gente como chegou, não teria ajudado tanta gente como ajudou. Mesmo se o Sabotage não tivesse feito RAP, o RAP ainda poderia ter se unido com outros ritmos e outros pensamentos, mesmo que eu ache que isso demoraria bem mais. Cá entre nós, se o Sabotage não tivesse feito RAP, o RAP poderia até ter se tornado grandioso, mas ele seria bem mais monótono e bem menos especial do que é hoje.
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